quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

CARTA DE CIPRIANO JOSE DA ROCHA - 09.12.1937

Rio Verde na altura de S. Lourenço.
 His dictis, vamos transcrever, em ortografia oficial, a referência sobre Campanha, quase dispensando comentários,  tão clara é a sua redação. Em 23 de setembro, mal convalecido, fiz jornada desta vila para o descobrimento das minas do Rio Verde, só famigeradas por uma obscura notícia de alguma pessoa que ocultamente dava mantimentos aos criminosos, que refugiavam naqueles desertos. Por força de diligências minhas, fiz romper matas e sertões, que pudessem franquear a estrada que, com efeito, se pôs franca para toda pessoa, assim de pé e a cavalo, como para cavalos carregados, desterrando todo o terror que se havia concebido aos criminosos que espalhavam vozes: defenderiam os sertões que habitavam, para que não fossem entrados de pessoa alguma, o que lhes seria fácil, não abrindo-se caminho capaz. Com efeito, depois de dez dias de jornada, cheguei àqueles sertões e com o meu exemplo entraram aos poucos que quiseram, e os criminosos se ausentaram. Fizeram-se experiências nos córregos e ribeiros. Ordenei que quem quisesse entrar na repartição das terras minerais désse a rol os negros que possue. Pelos bilhetes de capitação, fe-se a repartição por sortes. Não houve descobridor; e só o temor que acima relato e a minha diligência. Tiraram-se as datas pertencentes à fazenda Real; e as que me tocavam, como superintendente, ordenei se juntassem às da Fazenda e se rematassem para a mesma. Importou toda rematação em meia arroba de ouro e onze oitavas, e foi preciso esperar o pagamento até o primeiro de setembro do ano próximo vindouro; e se seguraram as rematações e confianças. Não tirei salário algum da repartição, nem cousa alguma aos poucos dos dias que despendí em toda a jornada e estada. Estão estas minas em uns dilatados campos, que as findam em vários córregos e ribeiros, com muitos matos proveitosos para à agricultura e, ainda que tarde, se plantou (plantaram) quasi trezentos alqueires de milho, em várias roças. Em todos os córregos e ribeiros se acha ouro que entra para a terra, pelo que promete duração. São certos os jornais de meias patacas, e, nos tempos que assisti naquelas partes, tive certeza que os negros davam de jornal a meia oitava e três quartos. Compreende o descoberto em circuito mais de vinte léguas

Fundei um arraial em forma de vila, o que se deu o nome de S. Cipriano, que está povoado com praça e ruas em boa ordem e muito boas casas, e ficava-se entendido em fazer Igreja. Determinei terra para casa de Intendência, que será preciso. Tem o dito arraial a comodidade de quatros rios abundantíssimos de peixe grosso e miúdo, que são Palmela, Lambarí, Sapucaí (que eu descobri) e o Rio Verde que leva ouro em conta, pela experiência que se tem feito. Mandei tomar terra para casas da Intendência. Foram quase sete mil negros a que se repartiram terras. Serão as ditas minas uma dilatada povoação, tanto  tendo pela extensão, que cada dia cresce, como pela comodidade do país, terra produtiva de mantimento e os ares benévolos.

O Rio Sapucaí, só conhecido pela tradição dos antigos paulistas, fiz descobrir pelo sertão destas Minas, por diligências e despesas minhas, até que pessoalmente fui às suas margens e o passei em canôa, que mandei fazer. É o rio abundante de águas, maior em muitas partes que o Rio Grande, porém de vagarosa corrente. Mandei explorá-lo para as suas cabeceiras. acharam-se disposições de ouro e também me informaram que, navegando três dias rio acima, se comunicarão às minas de Itajubá. A entrada do inverno, as continuadas trovoadas e chuvas suspenderam-me maiores indagações, como desejava. aperfeiçoei o caminho que, quando fui, fez três dias de ornada, e hoje se faz em menos de um dia do arraial, sendo aquele tempo na consideração dos homens duvidoso e com perigo cometer aquele descobrimento tanto que, sabendo no arraial a minha resolução, se ausentaram muitos, entendendo eu os obrigaria a acompanhar-me. Gastei 73 dias nesta diligência. acompanharam-me os soldados que V.S. mandou, com bom gosto e obediência; o meirinho geral, como bom oficial, pronto a tudo.

Entrei nesta ação, por entender fazia bons serviços a S. Majestade, sem mais interesse que dar-se o mesmo Snr. por bem serviço da minha intenção, e poderem se acomodar os vassalos e cessarem as queixas de muitos que não tenham onde minerar. Vão entrando muitas gentes; tem mantimentos em abundância e bom cômodo e continuamente estão entrando carregações. Será preciso crear-se Vila, com justiças pela distância que há à esta vila, sem embargo de eu mandar por em direitura o caminho que fica em pouco mais de três dias, mas sempre é distância. Obrei a despesas minhas, perdendo emolumentos, o que é notório. Deus Guarde a V. S.

S. João del Rei, 9 de dezembro de 1737. O ouvidor de S. João del Rei-
Cipriano José da Racho".

Arquivo: Memória Campanhense
04.08.2016

6 comentários:

  1. Ao Blogue "Isto é Campanha": parabéns pelas divulgações de cunho cultural. Nosso país precisa descobrir e valorizar a nossa cultura em todos os seus muitos aspectos. Estamos aguardando eventos, em Belo Horizonte, relacionados com o Ouvidor Cipriano José da Rocha (estamos num ano histórico, de efeméride mineira, estamos nas comemorações dos 300 Anos da Capitania de Minas Gerais), e, por isso, temos buscado informações sobre o assunto. A respeito de Cipriano, a(s) Carta(s) de Cipriano, o Arraial de São Cipriano: há farto e rico material esparso e que não se encontra na web. Localizamos seu blogue e, com sua devida licença, gostaríamos de registrar a sugestão para que nesta postagem sobre a "CARTA DE CIPRIANO JOSÉ DA ROCHA", vocês blogueiros (Daniel e José Milton), publicassem TODAS as CARTAS DE CIPRIANO alusivas à temática de(da) CAMPANHA e acrescentassem o nome do autor da transcrição do documento, uma vez que há distintas versões, algumas com significativas variações de um autor para o outro. Afinal, ISTO É CAMPANHA. Desde já, nós e todos os interessados na temática da cultura, agradecemos. Marcos Andrade-Belo Horizonte-MG.

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  2. Conto com a colaboração de todo brasileiro, mineiro do bem que queira postar matérias que venham a somar para o bem. Grato pelo comentário.

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  3. josemiltonjunqueira@gmail.com, tendo em vista que a trajetória deste singular Ouvidor CIPRIANO JOSÉ DA ROCHA do Brasil Colonial está extremamente comentada (Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Sergipe...) o interesse por material sobre ele é cada vez mais crescente. Por gentileza, em quais "sites" de sua cidade (PREFEITURA???CÂMARA???) podemos encontrar as CARTAS que CYPRIANO JOSEPH DA ROCHA escreveu sobre o SUL DE MINAS??? Já que aqui na postagem e no seu blog encontramos apenas UMA CARTA. São quantas cartas??? Vocês têm disponível aí na cidade de Campanha as cartas oficiais e as cartas pessoais??? André Carneiro Leão.

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  4. Na Secretaria de Cultura da Campanha e no Instituto Histórico e Geográfico da Campanha.São os lugares mais indicados.

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    1. Completando. Na Secretaria de Cultura temos o Centro de Cultura Monsenhor Lefort onde deverá encontrar mais artigos.Também na Biblioteca Cônego Victor com Luan (35-9.722.4492) e com a antiga e dedicada funcionário da biblioteca senhorita Angélica Andrés (35.9.8833.7350) Boa sorte.

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  5. André Carneiro Leão e equipe agradecem. A nossa intenção é estabelecer uma ampla conexão com vocês do Sul de Minas, a partir desta singular temática ligada ao ouvidor Cypriano, sua vida, obra e legado, uma vez que desenvolvemos projetos culturais internacionais. Já localizamos as diversas cidades ao longo do trajeto percorrido pelo ouvidor e estamos em contato com todas elas. Para nossa surpresa, há robustos trabalhos de muitas décadas, em toda a região sul-mineira, com escala, e com os mais variados propósitos. O trabalho desenvolvido em âmbito escolar, de modo interdisciplinar e transcultural, é exemplar. As atividades nos demais contextos é surpreendente, não só pela junção da tradição com a inovação, mas pelo envolvimento de todos os segmentos sociais de forma tão abrangente e cativante. Vocês, sul-mineiros, estão de parabéns pela criatividade e pelo dinamismo. É impressionante a pujança do cenário cultural sul-mineiro em relação ao Cypriano e à sua “muito famosa, lida e discutida” Carta (ou Cartas!) de Cypriano. Agradecemos também por todos vocês serem tão educados, agradáveis e receptivos, especialmente, por nos colocarem em contato com os portugueses: autoridades, conterrâneos e familiares de Cypriano. Seguiremos em contato, acompanhando o seu blogue e trabalhando todos juntos pela cultura, economia da cultura, turismo, geração de divisas, de qualidade de vida, exercício de cidadania em nossa amada Minas Gerais. Juntos somos todos muito mais fortes! Parabéns pelo seu trabalho de divulgação, Jornalista e Blogueiro José Milton!

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